Repúdio à decisão judicial do trote machista da Unifran postado em 10/11/19



Para quem não está a par do ocorrido, o caso foi um trote onde os estudantes fizeram um juramento, “guiados pelo acusado”, com palavras de baixo calão e com teor de submissão sexual dos calouros “mulheres em sua maioria” aos veteranos “homens em sua maioria”, na qual a lógica do discurso não foge as proporcionalidades.

O que dizer do episódio?

Primeiramente quero focar na questão da construção social.

Para mim, estudante de ciências sociais, é questão basilar que a cultura é uma construção social produzida pelos homens a fim de produzir novos homens moldados para a sociedade que se deseja.

Citando Simone de Beauvoir “Ninguém nasce mulher: torna-se mulher”, trocando a palavra mulher por humano a frase permanece com o mesmo sentido, um pouco mais genérica é claro, no entanto o que Simone nos diz, claramente refere-se a padrões socioculturais impostos pela coletividade às identidades individuais dentro da sociedade. Sociedade essa que, em sua coletividade é escola integral e vitalícia do ser humano, a qual produzirá bons ou maus integrantes, como diria Foucault, “o homem nasce bom, e a sociedade o corrompe”.

Portanto é inadmissível que negligenciemos casos de aletheia ‘que venham a luz’, de perpetuação de comportamentos discriminatórios, subjugação por gênero, etnia ou classe social, como se fossem um simple evento cultural com foliões de rua, mas como sendo o movimento de perpetuação de valores a serem banidos da nossa sociedade. Observando a brandura da sentença e o absurdo ataque político e desnecessário a contracultura em pleno séc. XXI, torna-se mais claro porque o Brasil foi o ultimo país a dar fim a escravidão.

Quanto a sentença...

Não me cabe pensar em nem uma justificativa para a fundamentação além de que, a juíza vitimada pela mesma moléstia social do acusado, em um ato de defesa própria, e para omitir o excremental episódio a mesma produziu um monte muito maior que encobrisse por completo o anterior.

Munida de uma série de falácias usando o feminismo como espantalho, envenenando o poço com acusações morais e repleta de autoridades irrelevantes, é proferida uma argumentação inquisitorial que fica claro o posicionamento religioso fundamentado em conceitos próprios de bons costumes com clara nostalgia a um passado moral que nem se quer existiu, e aparentemente um desgosto do cansaço imposto pela rotina de trabalho, “que não é uma obrigação, como sugerido ao criticar a luta pelo direito ao trabalho”, que me faz questionar se a juíza, visto a importância da posição que ocupa, possui capacidade de exercer sua função social, uma vez que sua falta de compreensão da mecânica social e confusões conceituais básicas entre direito e dever a colocam em posição de reciclagem...

O que penso sobre tudo isso...

Primeiramente não me sinto representado pelo padrão de masculinidade imposto pela cultura vigente, embora ainda esteja muito longe de não os reproduzir, e carente de muita reciclagem.

Não me vejo obrigado a prover solitariamente as necessidades de subsistência da família, deixando a cargo solitário da companheira a formação social da prole. Esse padrão só fortalece o distanciamento do homem da construção familiar e sua inabilidade no trato, se hoje temos altos índices de famílias “quebradas” não é porque as mulheres se tornaram degeneradas, e sim porque não são mais tão obrigadas por imposições religiosas e estatais de perdas de direitos ao deixarem seus maridos, nesse sentido o que muda é que o homem apenas perde a garantia da escrava do lar.

Quanto a sexualidade, ao homem a liberdade sexual sempre foi velada, talvez menos agora pela fragilidade que a liberdade da mulher de ir e vir causa nas relações, e talvez isso também justifique a resistência em estabelecer laços e constituir família visto a diminuição da liberdade sexual masculina. Só para exemplificar, não obstante déc. 80 a música “Puteiro em João Pessoa - Raimundos”, exemplifica um costume, rito masculino de passagem, onde primos mais velhos “inauguram” o novato, isso comumente também se aplica aos pais que certamente não ficavam esperando parados a “inauguração”.

No mais temos que fazer ampla análise, que não cabe no texto pela extensão, em relação a dificuldade contemporânea de socialização, da quebra cultural da distância entre gerações e a não identificação com o OUTRO dentro da sociedade, com o egocentrismos hedônico proporcionado pala sociedade de consumo focada no prazer individual.

Segue decisão na integra:


Gabriel F. P. Souza
Autor: Gabriel F. P. Souza

Licenciado em Ciências Sociais, graduado em Ciência da Computação, e um apaixonado por assuntos sobre a existência humana, suas organizações políticas, suas relações de produção e seus comportamentos em grupo.

Meu objetivo é observar, interpretar e propor análises sob a ótica da Sociologia, Antropologia e Ciência Política, usando os meios tecnológicos como princípio de interação social contemporânea.

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