A era da informação nos cegou, e as redes sociais nos matará! postado em 26/03/21


A era da informação nos cegou, e as redes sociais nos matará!

No princípio era o Homem, e o Homem fez o Algoritmo, e o Algoritmo era do Homem. Ele estava no princípio com Algoritmo. Tudo foi feito por ele; e nada do que tem sido feito, foi feito sem ele. No princípio criou o Homem as Redes e o Algoritmo. No fim o Homem era do Algoritmo.

 

Novos Paradigmas

Como programador aprendemos a desenvolver soluções. Lembro de algo que me disseram mais ou menos assim, “não tínhamos que fazer o que o cliente pedia, mas o que ele precisava, mesmo que ele não soubesse”. Era preciso prever anseios e necessidades, prever erros e, se preciso, ou melhor, sempre conduzir o usuário ao resultado desejado.

Para evoluir nossas tecnologias a um patamar cada vez mais eficaz não bastava apenas maquinas melhores, programas mais rápidos e simplificados, informações mais acessíveis. Era preciso entender o homem, como ele funcionava, como nossa mente operava.

Aprendemos como programadores a programar as maquinas, mas mais do que só isso, aprendemos a controlar as ações humanas, os anseios, os desejos, entupimos de informação sempre mastigada e simplificada para não dizer esvaziadas, selecionamos os conteúdos, mesmo sem critério de veracidade, em bolhas, “câmaras de eco”, alteramos mecanismos de nossos subconscientes que constituem o que somos, trabalhamos por minimizar a capacidade de errar, ferramenta tão necessária para o desenvolvimento humano que antes naturalmente nos programava, interferimos drasticamente nessa máquina biológica tão incrível e igualmente programável que somos, criamos ferramentas para controlar narrativas.

Inevitavelmente nós nos tornamos seres regidos por nossas próprias criações, o que não seria de tudo um problema, já que culturalmente falando nós sempre vivemos em uma dialética de reprodução cultural “produzimos a cultura que nos reproduzirá”. Porem, agora sem autonomia, entregamos nosso poder de escolha a mediadores, terceirizamos nossas vidas e entregamos aos donos da tecnologia que brincam de Deuses e nos manobram seu capricho.

 

A Nova Humanidade

Abordar o tema da influência da realidade virtual em nós, e como lidamos com essa mudança estrutural nas relações sociais não é simples. Algo tão significativo e novo requer tempo e distanciamento para ser compreendido, conhecimento que cabe a nós e às próximas gerações produzir, não há fontes para nos guiar. Seremos nós as fontes para as futuras interpretações.

No mais, o que já nos é perceptível, é que, o que ocorre no campo do virtual possui uma materialidade concreta em nossas vidas, na forma como vivemos, produzimos, consumimos, politicamos e nos relacionamos.

Outra característica fundamental dessa nova realidade parte da construção da nossa identidade como pessoa. Embora, antes da realidade virtual, já houvesse essa possibilidade de performarmos papéis diferentes nas relações sociais, algo até certo ponto bom e que já vinha sendo flexibilizado, o mundo digital acelerou o processo como nunca visto antes, não só permitiu criarmos papéis “o que também pode ser bom”, mas passamos a poder escolher “quando" e "quem" seríamos, o que, de certa forma, gera um paradoxo da escolha.

A formação da nossa identidade parte da nossa percepção da interpretação que o outro faz de nós, da reação que nossa ação causa no outro, do medo da perda do amor do outro, em resumo, da nossa capacidade empática. Conforme vamos experienciando as sensações do que gostamos ou não gostamos, e a aceitação ou rejeição causada no outro, começamos a criar um “fake self” que seria o papel ao qual normalmente iriamos performar como pessoa, e o grau de satisfação que retiraríamos da vida viria do quão esse fake self se relacionaria com o “true self” que seria o que realmente gostamos e queremos.

O que pega nesse contexto de realidade virtual é que facilitou de mais fakear nossos selfs, podemos criar perfiz diferentes e representar papéis diferentes a todo tempo. Assim como nos tornamos cegos no egocentrismo do próprio eco, aplaudidos por sombras de timbres parecidos, assumimos papel de verdadeiros ditadores que se fecham em suas bolhas de ressonância. Talvez em algum momento dessa cruzada, não sei qual, tenhamos perdido a capacidade de administrar tantos papéis, fizemos uma desordem a ponto de não encontrar os parâmetros referenciais de sociabilidade, até o true self se foi, não fazemos a mínima ideia nem de quem gostaríamos ser muito menos do que gostamos, deixamos de sentir, perdemos nossa capacidade empática.

 

O homem é sexo frágil da contemporaneidade

Se chegou até aqui, percebeu que o tema é autoconhecimento para abrir caminhos para lidar com a nova realidade, as mudanças e aceitar as diferenças. Conhecer-se requer permitir o sentir, expor as fraquezas, descascar as feridas, se reconhecer como falho, ser frágil.

Cá entre nós, de longe, essa é uma especialidade masculina...

Na tentativa de interpretar o mundo que nos rodeia, ainda que dentro de uma ótica muito limitada tanto pela proximidade com o objeto de análise quanto por não ser um estudo em larga escala me parece que nós homens estamos sofrendo um pouco mais nesse processo de adaptação. Não querendo generalizar pois, não é regra, mas apenas uma aparente maioria, tem muitos homens apresentando “Tela azul”, lembra aquela famosa tela de erro do lançamento do Windows, pois bem! Tem muita gente travada, girando em falso, bugando por aí.

Parece que o solavanco que essa mudança causou na sociedade gerou um erro fatal de execução do sistema operacional de algumas pessoas. A nova realidade não é 100% compatível, alguns querem restaurar o sistema em cinquenta anos, outros querem voltar para a monarquia e alguns mais corrompidos sonhando com a volta da idade média.

Ficou fácil testar esses erros, basta começar o dia com comandos básicos, como: “bom dia, tudo bem" ou coisa parecida, normalmente ocorrem respostas esperadas, exceto em alguns casos muito extremos de pane. Já se você der comandos que possuem conexões com assuntos mais complexos como: “Lula Livre", "Bolsonaro", "Covid” etc, daí já trava tudo e começa uma rotina robotizada que não responde mais a qualquer estímulo, perde-se a lógica, a interpretação de textos é comprometida, passa-se a simplesmente reproduzir, ofensas, vídeos do YouTube e textos padrões.

Não sei o que será de nós, homens e mulheres, se não passarmos a sentir mais, reavaliar nossos papéis, principalmente os de posse da verdade, está faltando humildade, sermos mais socráticos “só sei que nada sei”, precisamos ser mais flexíveis sem perder de vista o true self. E principalmente nós homens, precisamos lidar com o papel de superioridade machista de arautos da verdade, os detentores da racionalidade familiar, o frágil papel de infalibilidade. Já estamos culturalmente atrasados nessa corrida do sentir, façamos então para que nossa obsolescência nãos nos cause Tela Azul...  

 

“Nenhum homem pode banhar-se duas vezes no mesmo rio...

pois na segunda vez o rio já não é o mesmo, nem tão pouco o homem!”

Heráclito de Efeso

 

Quem seremos nós do outro lado desse oceano pandêmico e de experimento social que atravessamos a nado?

Uma sábia pessoa me respondeu quando lhe fiz essa pergunta: “Espero ser o que tem mais folego e os braços mais musculosos” rsrs...

 


Gabriel F. P. Souza
Autor: Gabriel F. P. Souza

Licenciado em Ciências Sociais, graduado em Ciência da Computação, e um apaixonado por assuntos sobre a existência humana, suas organizações políticas, suas relações de produção e seus comportamentos em grupo.

Meu objetivo é observar, interpretar e propor análises sob a ótica da Sociologia, Antropologia e Ciência Política, usando os meios tecnológicos como princípio de interação social contemporânea.

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